3 de março de 2012

[Fanfic - Onze Colheitas] "Vingança" Distrito 4



Peixes.
Tudo aqui cheira a peixe, pra onde olho, vejo peixes, todos só falam em peixes. Assim é a vida no Distrito 4.
Não que eu esteja reclamando, longe disso. Pra ser sincera, aqui poderia ser bem pior, eu ate gosto.

Meu pai me ensinou a pescar antes mesmo de eu aprender a falar. Todas os dias, a tardinha, saímos do nosso barraco, meu pai, minha mãe e eu, para virar a noite e ver o amanhecer lançando redes na imensidão de água que rodeia nosso Distrito. Eram raras as vezes que eu não ia, só me ausentava da pescaria quando estava doente, nesses dias meu pai ia sozinho, pois minha mãe ficava cuidando de mim. Quando chegamos, minha mãe me leva pra casa e me põe pra dormir, depois sai pro mercado do centro do Distrito, para vender os peixes com meu pai. 

Nossa família, apesar de pequena, é muito unida. Sou filha única, e como a única irmã que minha mãe tinha morreu nos Jogos Vorazes com apenas 12 anos e meu pai perdeu a família num naufrágio há anos atrás, também não tenho tios ou primos. Sempre fomos só nós três. Nós três e uns poucos amigos pescadores do Distrito. Embora ela nunca tenha me falado nada, eu acredito que minha mãe nunca quis ter filhos, por causa dos Jogos. Digo isso porque no meu aniversário de 12 anos, há um ano, ela estava muito triste, apreensiva, diferente daquela mulher alegre que todos os anos me acordava com beijos, cantando e dançando junto com meu pai e a noite, no barco, soltava sinalizadores no céu, um para cada idade que eu completava. Ano passado não foi assim, nem esse ano, há três meses, quando completei 13 anos. Ela ate tentou disfarçar, mas sei que ela teme por mim, teme que eu seja sorteada para participar do massacre dos Jogos.

Por falar nos Jogos Vorazes, hoje é o dia da Colheita.

Todo ano, nesse dia, a mesma rotina se repete. Meu pai vai pescar sozinho na noite anterior e eu fico em casa com minha mãe para descansar, pois a presença na praça é obrigatória e se eu saísse pra pescar não poderia dormir a tarde. Porém, esse ano eu insisti para que minha mãe fosse ajudar meu pai na pescaria, pois a época estava realmente boa para os negócios e o mar estava rendendo bons peixes.

- Mãe, é sério, pode ir. Eu vou só dormir, quando acordar vocês já estarão aqui novamente. – Eu pedia, tentando tranquilizá-la.

- Mas não quero te deixar sozinha, não num dia como hoje... – Ela evitava falar na colheita, era sempre muito difícil pra ela lembrar da irmã e pensar que eu poderia ser convocada para participar.

Depois de muito insisti, ela cedeu, relutante, prometendo voltar 3 horas antes, para preparar um ótimo café da manhã para mim.
Assim assisti eles subirem a bordo do barco e avançarem pelas águas, seguidos de mais 3 barcos, dos nossos vizinhos e amigos.

Depois que eles desapareceram de vista, subi a rua, tentando encontrar a Jess, a filha mais velha de um pescador amigo do meu pai. Desde pequena que sou amiga da Jess, apesar dela ser 2 anos mais velha. A encontrei perto do mercado.

- Não foi pescar hoje, Marrie ? – ela perguntou confusa.

- Não. Véspera da Colheita... – Falei, lançando um olhar significativo.

- É mesmo, tinha esquecido que você nunca vai nesse dia. – A Jess me conhecia bem, ela sempre ia lá em casa, me ajudar nos estudos e conversar comigo. – Então, sua mãe também está em casa, certo?

- É, não... Esse ano eu pedi que ela fosse ajudar o papai.

Fomos andando em direção ao mercado, quando avistamos aquele grupinho de garotos, todos em volta de outro garoto, um pouco mais velho.

- Aquele é Jason, soube que ele vai se voluntariar amanhã, na Colheita. – A Jess me falou, baixinho. – Ele tem 16 anos, é filho do Patrick Donavan.

Patrick Donavan tinha sido um campeão dos Jogos Vorazes há cerca de 25 anos atrás.
Seguimos para o mercado, ficamos por lá algum tempo depois voltei para casa, para descansar. 

Acordei assustada, com batidas fortes na porta. Demorei um tempo para perceber que era a voz do Billy, amigo do meu pai, e pai da Jess, que gritava por mim. Corri para abrir e me deparei com o Billy completamente perturbado. Ele não falava coisa com coisa, ofegava muito, não dava pra entender muito bem o que ele queria me falar, mas ele conseguiu me deixar nervosa.

- Marrie... você tem que vir... seu pai... vamos comigo! – O Billy já me puxava pela rua, em direção a seu barco, que estava atracado. Ainda estava escuro e havia muitas estrelas no céu.

Navegamos por cerca de 20 minutos no mais profundo silencio. Sempre que eu tentava perguntar algo pro Billy, ele começava a tremer e a gaguejar, eu não entendia nada, mas a esse ponto eu já me perguntava por onde estariam meus pais. 
Quando avançamos mais um pouco, pude ver uma movimentação de barcos fora do normal. Estavam todos parados, havia uns homens dentro da água, muitas luzes de lanternas e tinha pedaços de um barco flutuando.

Meu mundo parou. Aquele era o barco do meu pai! O barco que todas as manhãs eu ia navegar, o barco que já me trouxe tantas alegrias estava agora aos pedaços.

- Billy, aquele é o barco do meu pai! – Gritei desesperada. – Mas cadê eles? Onde está meu pai e minha mãe? Você os deixou aonde, Billy? – Nesse ponto meus olhos já estavam cheios de lágrimas. Mas ninguém me respondia.

Billy ancorou o barco e um dos homens que estava na água se aproximou.

- Nós conseguimos encontrar eles. – O homem falou, eu o conhecia das pescarias, mas não lembrava seu nome agora.

- Encontrou quem? São meus pais? Onde eles estão? Preciso vê-los... – A ultima parte saiu como uma súplica – Me leva até eles, por favor. – Agora eu já chorava muito.

Billy trocou um olhar angustiado com o outro homem, que confirmou algo que o Billy perguntou com os olhos.

- Marrie, preciso te falar uma coisa. Aquele barco era do seu pai sim. – Billy segurou minhas mãos e me fez sentar na madeira molhada do barco – Há algumas horas a lancha dos Donavan apareceu em alta velocidade, bem no lugar onde seus pais estavam pescando... Estava escuro, a lancha bateu direto no barco de seu pai... O barco partiu, seus pais caíram na água... O motor da lancha é muito potente e... puxou eles debaixo d’água... Eles não subiram mais à superfície... – O Billy cobriu o rosto com as mãos e baixou a cabeça.

Eu não sabia mais o que dizer ou pensar ou fazer. Eu não conseguia, ou não queria entender o que estava acontecendo. O que o Billy quis dizer com “não subiram mais à superfície”?

- Onde estão meu pais, Billy? – Falei, quase sem voz.

- Vou te levar ate eles. – Ele falou, entrando na água e me apoiando em seus ombros, para que eu pudesse nadar com ele até um barco que estava mais adiante. 

No percurso pude ver a lancha luxuosa dos Donavan, que foi um dos presentes pela vitória do Patrick nos Jogos, e dentro dela estava uns pescadores, amigos do meu pai e o Jason! O mesmo Jason que eu vi no fim da ultima tarde sendo idolatrado por outros garotos.

- O Joe foi buscar o pai dele. Foi muita irresponsabilidade deixar o garoto navegar por aí a noite. – O Billy falou como se entendesse meus pensamentos.

Chegamos a um barco, não sabia a quem pertencia. Ajudaram-me a subir e quando coloquei os pés dentro da embarcação pude vê-los. Meus pais estavam deitados no chão, um ao lado do outro, desacordados. Mortos!
Isso não podia está acontecendo comigo! Não pode ser! Meus pais, que são tudo que eu tenho, não podem ter morrido assim!

Então tudo ficou escuro e não senti mais nada.

Abri os olhos e estava em casa, completamente seca. Ouvi uns barulhos vindos da cozinha. Então é isso? Foi tudo um pesadelo e minha mãe está fazendo meu café da manhã? Esse pensamento me encheu de esperança e corri ao encontro da minha mãe. Mas não era minha mãe, era a Veronica, esposa do Billy, mãe da Jess, que estava na minha cozinha. Ela parecia cansada e tinha os olhos marejados, como se tivesse chorado muito. Foi então que percebi que era tudo verdade, que aquele pesadelo tinha acontecido mesmo e que agora eu não tinha ninguém no mundo. Mais lágrimas surgiram nos meus olhos e não pude segurar mais.

Veronica correu para me consolar, me levou a mesa e pediu para que eu comesse, pois ela me levaria à Colheita e depois iríamos providenciar o funeral dos meus pais. Ela também me prometeu cuidar de mim e que jamais me deixaria faltar nada. Não consegui comer quase nada e mal tinha acabado de me vestir quando Pacificadores chegaram a minha casa, para fazer a verificação se todos já estavam no Centro do Distrito, onde seria feito o sorteio dos jogadores dos Jogos Vorazes. Eles nos apressaram e seguimos para o lugar marcado.

Era torturante demais, depois de passar por tudo que passei ainda ter que assistir a um sorteio idiota que idiotas preparavam para fazer jovens se matarem, enquanto um país inteiro se divertia com isso.

Quando tomei meu lugar, na segunda fileira, dos menores para os maiores, eu o vi. Jason Donavan estava mais prepotente do que nunca, só aguardando seu momento de se voluntariar para os Jogos. Um ódio sobrenatural subiu por minhas veias naquele momento e minha vontade era de ir ate ele e arrancar seus olhos. Me peguei desejando a pior das mortes para ele naqueles Jogos e jurei para mim mesma, que se ele voltasse como vencedor, eu mesma o mataria!

- MARRIE BENNET 

Estava tão envolvida no meu ódio que só percebi quando Terence, o homem que fazia os sorteios no meu Distrito há anos, gritando meu nome. Olhei para o palco e Terence segurava um papel, ele tinha acabado de tirar meu nome e eu era a mais nova participante dos Jogos Vorazes. Subi ao palco, e percebi o olhar surpreso da maioria dos moradores. Chegou a hora de sortear o nome do garoto e eu enfim percebi o que havia acontecido. A ficha caiu no momento em que Jason Donavan levantava sua mão e gritava

- EU ME VOLUNTARIO COMO TRIBUTO!

Eu ia para os Jogos Vorazes com o assassino dos meus pais e jurei, pela alma deles, que o mataria lá, custe o que custar!



Postado por Lu. 

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